sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Wislawa

Gosto de buscar escritores, procuro pessoas com jeitos diferentes de contar histórias, pessoas que me mostrem algo novo, pessoal, escritores com os quais eu me identifique.

De fato, uma das minhas buscas mais incansáveis se resumia a poetisas. 
Não que não existam poetisas... Existem várias, porém, das poetisas as quais já li alguns textos resumem suas obras - na sua imensa maioria- a poemas existenciais, em particular, poemas de amor (com excessões de um ou dois poemas esparsos em obras inteiras, o que as torna reconhecidas são os poemas amorosos). 
Isso tem uma explicação: as mulheres vivem mais intensamente a paixão e o amor, elas amamentam, carregam seus filhos no ventre, têm um coração e um instinto de amar mais intensamente... Por isso escrevem tão bem sobre tal "sentimento". 
Os homens, porém, parecem escrever sobre tudo! Peguemos como exemplo o mestre Fernando Pessoa: escreveu sobre amor, melancolia, tecnologia, existência, metafísica, enfim, sobre a vida. E Vinicius de Moraes? Além de seus famosos poemas de amor ele possui uma obra inteira dedicada à críticas sociais. 

Pois era essa a minha busca: uma Poetisa, que em sua obra predominantemente não falasse de amor. 
E a encontro no dia de sua morte: Wislawa Szymborska!  Uma polonesa, vencedora de um prêmio nobel de literatura, muito famosa em diversos países mas pouco conhecida aqui no Brasil. Um pouco da vida de Wislawa nesse link ( http://www.algumapoesia.com.br/poesia3/poesianet265.htm ).

 Trecho retirado do site acima:
Wislawa Szymborska



O TERRORISTA, ELE OBSERVA 
A bomba explodirá no bar às treze e vinte.
Agora são apenas treze e dezesseis.
Alguns terão ainda tempo para entrar;
alguns, para sair.
O terrorista já está do outro lado da rua.
A distância o protege de qualquer perigo.
E, bom, é como assistir a um filme.
Uma mulher de casaco amarelo, ela entra.
Um homem de óculos escuros, ele sai.
Jovens de jeans, eles conversam
Treze e dezessete e quatro segundos.
Aquele mais baixo, ele se salvou, sai de lambreta.
E aquele mais alto, ele entra.
Treze e dezessete e quarenta segundos.
A moça ali, ela tem uma fita verde no cabelo.
Mas o ônibus a encobre de repente.
Treze e dezoito.
A moça sumiu.
Era tola o bastante para entrar, ou não?
Saberemos quando retirarem os corpos. Treze e dezenove.
Ninguém mais parece entrar.
Um careca obeso, no entanto, está saindo.
Procura algo nos bolsos e
às treze e dezenove e cinqüenta segundos
ele volta para pegar suas malditas luvas. São treze e vinte.
O tempo, como se arrasta
É agora.
Ainda não.
Sim, agora.
A bomba, ela explode.
Tradução: Nelson Ascher
(Versão realizada a partir da versão inglesa de Adam Czerniawski e da
norte-americana de Magnus J. Krynski e Robert A. Maguire)



Trecho retirado do livro "Poemas", publicado pela primeira vez no Brasil recentemente pela Companhia das Letras


Recital da autora
musa, não ser um boxeador é literalmente não existir.
Nos recusaste a multidão ululante.
Uma dúzia de pessoas na sala,
já é hora de começar a fala.
metade veio porque está chovendo,
o resto é parente. Ó musa.
as mulheres adorariam desmaiar nesta noite outonal,
e vão, mas só ao assistir a uma luta colossal.
só lá as cenas dantescas.
e o ascenso aos céus. Ó musa.
Não ser boxeador, ser poeta,
estar condenado a duras florbelas,
por falta de musculatura mostrar ao mundo
a futura leitura escolar — na melhor das hipóteses —
Ó musa. Ó pégaso,
anjo equestre.
Na primeira fila um velhinho sonha docemente
que a finada esposa ressuscitou e
assa para ele um bolo com passas.
Com fogo, mas não alto, para o bolo não queimar,
começamos a leitura. Ó musa



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